Cassio Politi: O Think Tech está no ar, meu nome é Cassio Politi, e junto com a Algar Tech, nós vamos embarcar nessa jornada de repensar possibilidades. No episódio de hoje a gente faz uma imersão em tecnologia no agronegócio. E olha, nos últimos anos, o crescimento do agro foi muito mais positivo do que negativo, eu digo isso porque oscilou em algum momento ou outro, mas em geral o agro só cresceu nos últimos anos. Eu vou então acionar a especialista virtual em negócios aqui da Algar Tech, a Sara, que tem um vasto repertório digital, ela fala de tudo, inclusive de agro, hein Sara?
Sara: Olá, Cassio. O agronegócio é um dos setores mais importantes da economia do Brasil. No ano passado, por exemplo, o agro representou mais de 27,4% do PIB brasileiros, foi a maior participação do agronegócio no PIB desde 2005, até ali, o melhor resultado tinha sido em 2004, quando 27,5% do PIB veio do agro.
Cassio Politi: Para o bate-papo de hoje eu tenho a satisfação de receber o Leonardo Gondim, que é diretor de marketing e tecnologia da Cargill, que é uma empresa que dispensa talvez apresentação, mas não custa dizer que é a maior empresa de agronegócios do mundo, é legal dizer que ela vai da terra ao garfo, porque opera em todos os segmentos de alimentação, ou seja, ajuda o produtor a plantar e ajuda a comida a chegar nas nossas mesas, não só no Brasil, isso no mundo inteiro. Leo, muito prazer ter você aqui, obrigado por aceitar o convite para essa conversa.
Leonardo Gondim: O prazer é meu, Cassio, uma honra estar aqui contigo, com vocês, eu sou fã do podcast, fã do seu trabalho, então é um prazer estar aqui.
Cassio Politi: Obrigado, que honra saber disso, ter uma audiência tão qualificada assim, obrigado Leo. E queria começar falando com você sobre um desafio que cada vez mais bate à porta das empresas e das pessoas, que é a alimentação, o agro tem uma participação central nisso. Porém, os grandes players dessa indústria são os mesmos há muitas décadas, e é uma indústria que muda pouco, e daí vem a minha pergunta, o que tem de inovação no setor do agro que merece destaque quando a gente fala dessa missão de alimentar o mundo?
Leonardo Gondim: Legal, excelente pergunta, Cassio, e talvez até me permita, antes de dar alguns exemplos do que tem no setor, dar um pouco mais de contexto em relação ao estágio de inovação, o estágio de disruptiva digital talvez que está o agronegócio hoje, é o setor de alimentação no mundo. Tem um estudo que eu gosto muito do MID da Suíça, que ele fala sobre digital vórtex, a cada dois anos eles soltam um release sobre o digital vórtex, ele mostra quais setores estão no centro do vórtex, que são os setores que mais sofreram mudança, ou mais sofreram disruptiva digital, aí você tem o setor de mídia e entretenimento, você tem o setor bancário, telecomunicação, que a gente está cansado de ver o quanto que esses setores nos últimos, dez, 15, talvez até 20 anos se transformaram, e o agronegócio está lá atrás em relação ao nível de disruptiva, ao nível de digitalização que ele tem. Embora, comparado a outros setores, ele esteja ainda engatinhando, esse engatinhar está cada vez mais acelerado, a verdade é essa. Então, tem surgido muita inovação no agro, em todos os setores, então desde a produção de alimento em si, e a gente pode falar de qualquer tipo de produção, vão ter inúmeros exemplos, até transporte, comercialização, inclusive as food techs hoje fazendo disruptiva na forma de produzir alimento, da forma como esse alimento é entregue para o consumidor. O grande desafio que está por trás disso, que é o que eu acho mais interessante, é que a gente fala do mundo hoje de 7 bi e meio de pessoas, e a projeção para chegar a 2050 ao redor de 9 e meio bi, 10 bi de pessoas, ou seja, a gente tem um desafio de escalar uma produção de alimentos de forma significativa no mundo, então é um setor que vai precisar se digitalizar, vai precisar de muita inovação para fazer que isso aconteça, uma necessidade básica, a gente está na base da pirâmide de (inint) [00:04:56] de alimentação. E ao mesmo tempo, falando de recursos escassos, então a gente vai ter que escalar essa produção de alimentos com uma população crescente, no mundo, hoje, que está bastante ocupado em termos de uso de recursos naturais, seja solo, seja água, seja clima, então é um desafio bastante grande, e a tecnologia e inovação vem apoiar nisso. E como alguns exemplos, Cassio, de inovação, a gente tem tanto inovações que visam melhorar a produtividade do produtor no campo, seja medir o que ele faz, tomar decisões mais assertivas, digitalizar etapas da cadeia de produção dele, e a gente tem disruptivas também na ponta, no varejo e na produção de alimentos, então food techs, estando com alimentos alternativos, buscando formas mais sustentáveis de produzir alimento, ou entregando esse alimento de forma mais, vamos dizer, sem atrito para o consumidor final também, e atendendo necessidades do consumidor, que tem mudado e tem mudado a cada dia.
Cassio Politi: Interessante ter esse overview que você trouxe, e você, Leo, mencionou que tem as startups chegando ao agro, são entrantes, e todas entrantes trazem inovações, quando isso acontece, as empresas tradicionais, que a gente, em certas literaturas, chama de incumbente, são obrigadas a se mexer, e isso já está acontecendo no agro? As incumbentes já perceberam, já sentiram que tem que mexer e tem que mudar em alguma coisa por causa dessas startups que você mencionou?
Leonardo Gondim: Já. E como você comentou, Cassio, o agro ainda é um setor de empresas centenários, posso pegar até a Cargill como exemplo, é uma empresa que tem mais de 150 anos de idade, e eu falo muito isso aqui para o meu time, que trata com inovação e tudo, que a gente tem que se inspirar em outros setores, então hoje se eu pegar o setor de telecomunicação, por exemplo, e pensar nas empresas que a gente usa para se comunicar, nas novas formas de comunicar, vou até um pouco mais atrás no Skype, mas se eu pensar no WhatsApp, em redes sociais hoje, nenhuma dessas empresas vieram de empresas… das incumbentes, como você comentou, de telecomunicação. O mesmo tende a acontecer com o agro, óbvio que a gente também está se movimentando para antecipar esse movimento. Então, tem surgido muitos startups, as startups surgem em uma etapa muito específica da cadeia de produção, então é difícil achar uma startup que vai ter uma abrangência muito grande, ele vem muito focada, ela tenta resolver um problema específico do produtor ou do consumidor, ela tenta fazer isso de forma rápida, para depois ela ganhar escala. Isso pode ser uma food tech, por exemplo, com proteína alternativa, tentando desenvolver carne de laboratório, por exemplo, isso pode ser uma empresa hoje, vamos pegar uma empresa que busca automatizar processos de produção animal, então um exemplo aqui, empresas de visão computacional, que tentam monitorar a atividade do animal através de câmera e de identificação por imagem, para eu melhorar minha produtividade, eu tomar decisões mais efetivas, mudar minha nutrição, mudar manejo, uma série de coisas. Então, tem muitas startups surgindo, tem um radar do agronegócio no Brasil que se você pegar os dados, a multiplicação das startups tem sido exponencial nos últimos anos, e as incumbentes, como a Cargill, por exemplo, o que a gente tem feito muito é entender que nesse novo mundo não se joga mais sozinho, você tem que ser um ecossystem player que a gente chama, você tem que jogar em ecossistema, e você tem que fazer parcerias com startups para você acelerar sua inovação. Então, hoje, aqui dentro do meu escopo, focando em nutrição animal, que é a área que eu atuo dentro da Cargill, a gente tem hoje parceria com pelo menos seis ou sete startups desenvolvendo produtos em conjunto, levando soluções ao mercado, e com um modelo de negócio onde eu não posso ter aquele modelo de negócio, vamos dizer assim, antiquado, que é eu vou encapsular a startup, eu vou simplesmente comprar a startup e trazer dentro do meu negócio, mas não, eu vou formar uma parceria onde eu sou sócio dessa startup, onde eu tenho capabilities, eu tenho capacidades, como a minha capilaridade de vendas, por exemplo, é uma capacidade que eu tenho e a startup não tem. Ao mesmo tempo, a startup tem uma capacidade de tecnologia e de rapidez que eu não tenho, então a gente junta, a gente busca hoje juntar pontos fortes dos dois lados e formar uma simbiose, uma sinergia para ir no mercado junto, então essa é um pouco da estratégia, pelo menos a Cargill está usando e a gente tem tido muito sucesso nesse tipo de estratégia, de se aproximar, mas tem muitas startups surgindo, em uma velocidade muito grande no agronegócio.
Cassio Politi: Pois é, e muito do que se evoluiu nas indústrias de tecnologia, por exemplo, pegando um paralelo, você pega indústrias de um outro setor, que é a tecnologia, talvez… as da transformação digital, para especificar a quais eu estou me referindo, então empresas que trabalham ali, de alguma maneira, provendo inteligência artificial, armazenamento em nuvem, manufatura aditiva, qualquer uma dessas áreas, você vê que muito do que evoluiu tem a ver com mensuração de resultados, quando mais mensurável melhor, remete um pouco ao Peter Drucker lá atrás, que o que não pode ser mensurado não pode ser gerenciado, é claro que é uma das frases mais conhecidas, ele tem outras mais profundas e mais brilhantes até, mas é uma pura verdade. No agro, como é que está a mensuração? Está caminhando? Está em um nível maduro já? Como é que está?
Leonardo Gondim: Excelente ponto, Cassio, e eu falo que esse eu diria que é o maior desafio hoje do agro, porque tudo começa por… se você não mede, você não faz uma melhoria rápida no processo, e o conceito que você falou. Então, o primeiro passo para o agro é… e para você medir, você tem que levar tecnologia para a ponta, o campo, você tem que sensorizar, você tem que ter formas de capturar dados. O maior desafio hoje do agro é essa captura de dados, por duas razões, primeiro porque você não tem uma cobertura de internet ainda satisfatória, onde a ponta está produzindo, então esse é um grande desafio, e tem muitas empresas olhando, como é que eu gero cobertura de rede de forma barata, viável, para que máquinas, implementos, medições no campo, então vamos dar um exemplo, se eu pego uma produção a pasto, como é que eu vou medir o quanto que o animal está comendo, monitorar aquele animal, o quanto ele está caminhando, quanto que ele está ingerindo, se ele está bebendo água, se ele está comendo suplemento na quantidade correta, até o próprio fornecimento do alimento para aquele animal são coisas que você ainda precisa sensorizar a ponta e você precisa criar processos de automação para que você consiga gerar dados, Cassio. Então, mesmo quando você tem hoje, hoje a gente já trabalha com sistemas de gestão em produção animal, em confinamento, em granjas, em produções a pasto, ainda é uma dificuldade que você consiga que o produtor adote, insira dados entro do sistema de gestão, que esses dados vão transformar em inteligência. Então, o primeiro grande desafio é capturar dados, isso por levar sensores para a ponta, e por ter cobertura de rede para que toda essa tecnologia possa funcionar. Eu adicionaria um terceiro ponto aí, que é a cultura de capturar e fazer registros de dados, porque uma coisa é você colocar sensor e automatizar essa captura de dados, outra coisa você depende de muitas intervenções humanas, o agronegócio é um processo muito manual, você precisa de muitas intervenções humanas ainda, principalmente a produção animal, para fazer essa captura de dados. Então isso está ainda engatinhando no agro, tem um espaço enorme para a gente progredir, e é óbvio que existem diferenças aí, quando você vai para um ambiente mais controlado, então você vai para uma granja, por exemplo, de uma avicultura, com suínos, essa captura de dados é muito mais robusta, você está em um ambiente controlado, geralmente são áreas onde você tem cobertura de rede, você consegue gerar uma infraestrutura de sensorização e automação muito melhor. Quando você vai para a produção a pasto, para a agricultura em larga escala, aí você encontra as barreiras que eu comentei, e essa captura de informação é muito mais difícil. Então eu vou dar um exemplo simples aqui, a produção leiteira, se eu tenho uma produção leiteira confinada hoje, dentro de um modelo de (inint) [00:13:54], hoje eu já começo a ter soluções de câmera, onde eu coloco uma câmera e eu consigo monitorar o animal por visão computacional, eu consigo começar a gerar dados a partir do monitoramento que eu faço. Mas quando eu vou para uma produção a pasto, que é a maior parte da produção do Brasil, isso simplesmente não acontece, algumas soluções que estão surgindo hoje é colocar poste com câmera, mas ainda a escala disso e a forma de fazer isso ainda é muito cara, ainda você não consegue fazer isso em uma escala que te proporcione essa geração de dados, e como você comentou, esse loop incremental de melhorias.
Cassio Politi: Você falou de automação, e lembrei aqui de uma breve experiência que eu tive, vou contar aqui. Uns anos atrás eu atendi uma empresa do setor de saúde animal, por isso eu visitei várias fazendas de produção de leite no Brasil, no interior de São Paulo, na região de Rio Preto, Minas Gerais, também na Colômbia, a gente foi até lá, Bogotá, Medelín, passamos um tempo lá. E é visível a diferença de desempenho nos dois países que eu pude ver, na Argentina também, três países que a gente fez esse trabalho, é visível a diferença de desempenho das fazendas mais tecnificadas em comparação com aquelas que dependem da mão de obra que você mencionou. Aí vem minha pergunta, hoje, a automação está ao alcance de qualquer produtor? Ou tudo isso que você desenhou como um cenário ideal ainda é muito caro para a maioria?
Leonardo Gondim: Perfeito, é um excelente outro bom ponto, Cassio. Eu diria que sim e não, então deixa eu ser mais específico na minha resposta. Bom, primeiro, antes disso, você comentou aí sobre a adoção de tecnologia na produção, a diferença quando você adota e não adota, uma coisa que eu reforço muito em palestras que eu falo ou em eventos que eu participo, é que na minha visão vão existir dois produtores no futuro, aqueles que adotaram tecnologia, melhoraram a rentabilidade do seu negócio e conseguiram crescer e prosperar, e aqueles que ficam no livro de história, que a gente vai guardar na recordação, mas eles não vão existir mais. O mercado, à medida que a gente ganha maturidade no agronegócio e que você tenha mais e mais tecnologia, você vai ter dois caminhos, o produtor vai adotar essa tecnologia e vai progredir, vai ganhar rentabilidade, vai ficar no negócio, e o produtor vai sair do negócio. Agora, acessibilidade dessa tecnologia. Primeiro, existem diversas tecnologias, você pode falar desde uma automação de ordenha, por exemplo, que é algo talvez um pouco mais acessível para uma determinada escala de produtor, você pode falar de colocar, como eu estava dando o exemplo, de colocar uma visão computacional, onde você precisa de uma infraestrutura de confinamento para fazer isso, e mais do que isso, você precisa investir nessa estrutura, ou uma ordenha por robô, onde você demanda um investimento. Em geral, o produtor não adota tecnologias que não se paguem, acho que esse é um primeiro ponto, então qualquer tecnologia que vai chegar para o produtor, não que ela precisa estar ao alcance, mas ela precisa ter payback, ela precisa ter um business case positivo, ela precisa se rentabilizar, e hoje, muitos produtores tem acesso a crédito para fazer esse tipo de investimento, seja através de sistemas de cooperativa, e os bancos, hoje, os mesmos bancos de varejo, se pegar os grandes bancos brasileiros, eles estão buscando muito aproximar do agronegócio, esse é um movimento recente, de alguns anos para cá, eles estão se aproximando muito e disponibilizando crédito para produtores, através também de cooperativas de crédito, as próprias cooperativas tem um sistema de muito sucesso no Brasil. Então, hoje, eu diria que a grande maioria dos produtores sim, tem acesso à tecnologia por meios de ou acesso a crédito ou recurso próprio, ou mesmo, a gente tem que pensar que algumas tecnologias são levadas através das cooperativas, então eu tenho uma grande cooperativa que faz uma parceria com empresas como a Cargill, como outros grandes players, ou até mesmo com startups, tem várias cooperativas hoje trazendo startups, eu acabei de conversar hoje à tarde uma cooperativa com um hub de inovação, criando um hub de inovação dentro da própria estrutura da cooperativa. Então, com isso, ela consegue fazer com que aquele produtor menor cooperado tenha acesso a tecnologia, então hoje eu diria que essa tecnologia é muito mais acessível do que talvez a cinco anos atrás, por esses motivos que eu comentei, eu diria que as barreiras de adoção de tecnologia estão sendo retiradas dos produtores. Então, hoje, eu diria que a maior barreira é o próprio mindset do produtor.
Cassio Politi: Tem um aspecto importante aí para todos esses players, dos grandes aos pequenos que você citou, que é a logística, no agro nada substituiu ainda a logística, não sei se um dia vai ter essa tecnologia, não consigo imaginar qual seria. Então ela está aí, é necessária, e a gente, sempre que fala de agro, associa muito rapidamente, quando você compara, por exemplo, o desempenho de um país ao desempenho do outro, produtividade e eficiência, a logística é um componente ali, não vou dizer que é o principal, até porque eu não sou especialista para isso, mas tranquilamente é um componente. A cadeia toda do agro, plantação, transporte e armazenamento também nunca mudou, o que a tecnologia pode trazer? Você consegue fazer esse exercício de entender como a tecnologia ajuda nessa cadeia relacionada a logística?
Leonardo Gondim: Sem dúvida, Cassio, também é um excelente ponto, é um grande desafio, também não sei dizer se é o maior, mas com certeza está entre os três ou cinco maiores, sem dúvida nenhuma. E eu acho que a tecnologia tem vindo atuar de várias formas, eu vou dar alguns exemplos. Hoje, se você pegar uma granja de aves ou uma granja de suínos, você tem silos de ração acoplados a aquela granja que está fornecendo comida ao animal. Hoje, como é que você faz o abastecimento e o planejamento desse…? Ainda é totalmente de forma manual. Então uma coisa que está acontecendo, está começando a surgir sensorização para silo, eu coloco um silo de volumetria, eu meço o volume em tempo real, esse é o exemplo inclusive que a gente está trabalhando com uma startup canadense, está trazendo para o Brasil hoje, a gente já está fazendo isso com alguns clientes, eu monitoro o estoque de comida em tempo real e eu melhoro, eu faço um abastecimento muito mais preciso just in time, então eu vou no momento certo de abastecer aquele silo, eu evito desperdício com sobra, porque eu tenho um abastecimento muito mais preciso, eu tenho uma logística muito mais eficiente do que eu tinha antes, porque eu sei exatamente quando vai faltar o estoque, eu consigo planejar a minha produção de ração, eu consigo antecipar e fazer um planejamento de produção de ração, e eu consigo inclusive ter uma entrega, uma roteirização de caminhão muito mais eficiente. Então, um exemplo que está acontecendo aí, já começa acontecer dentro das granjas, dentro da produção, e aí vamos extrapolar isso agora, como você falou aí, para armazenagem de grãos, ou transporte de grãos até porto, até terminais de exportação. Primeiro que uma coisa que é um pouco silenciosa assim, Cassio, muita gente não percebe, mas a infraestrutura logística do Brasil também está melhorando muito, se a gente olhar nos últimos anos, os investimentos que foram feitos em portos, terminais, ferrovias, canais para escoar a produção no Brasil, a gente vem melhorando bastante a qualidade disso, tem muito para fazer sem dúvida, tem um trabalho imenso ainda para ser feito, mas vamos pensar o quanto que o Brasil está crescendo de produção de alimento nos últimos anos, e boa parte dessa produção está sendo escoada, porque o Brasil vai continuar aumentando a pauta de exportação dele nos próximos anos. Isso só está acontecendo porque tem muita empresa trabalhando também em melhorar essa infraestrutura. Agora, tecnologia, como é que a gente leva isso? Programação just in time, então saber… eu conseguir programar minha cadeia logística desde quando eu vou abastecer, por exemplo, um cliente na China, até o ponto onde eu vou produzir, a tecnologia entra para integrar todos esses processos e fazer com que eles trabalhem ajustados. Então muitas vezes, a capacidade de estocagem não é maior porque eu deixo o grão mais tempo lá do que ele deveria, se eu começo a ter processos integrados de supply chain, começo a trabalhar com logísticas mais otimizadas, eu estou otimizando também minha capacidade de armazenagem, estou otimizando minha capacidade de transporte, isso vai desde sensorização de silo, isso vai desde de roteirização de caminhões, isso vai desde integração entre cadeias de suprimentos de empresas distintas, então tem uma série de tecnologias que você pode aplicar nessa cadeia também, e sem dúvida é um mar de oportunidade ainda para ser explorado.
Cassio Politi: (inint) [00:23:01] aqui abordar um tema que não está distante desse, disso tudo que a gente está falando aqui, que é entender o conjunto de atividades, a gente fala o agro como uma forma geral, mas agricultura e pecuária, pelo menos na minha cabeça são as duas que vem com maior força, não vou também ser simplório de resumir a isso, mas eu acho que até na escola a gente aprende isso, você aprende essas palavras muito cedo, agricultura e pecuária. Em termos de desenvolvimento, a gente pode colocar as duas no mesmo pacote? A agricultura se desenvolve no mesmo pace, na mesma velocidade que a pecuária quando a gente fala de tecnologia, ou são ritmos diferentes no que tange tecnologia?
Leonardo Gondim: Legal. Não, são ritmos diferentes, Cassio, e eu diria que a agricultura já está em um estágio mais avançado do que a pecuária no Brasil, a pecuária está caminhando, está caminhando rápido, mas isso, Cassio, ele passa também pela questão de maturidade, eu diria de mercado. Então, hoje, na agricultura, você tem já produções de uma escala maior, você tem grandes grupos, ou grandes fazendeiros com produções de larga escala, já existe o… eu diria que o agricultor hoje já tem uma característica maior de empresário do que o pecuarista. Eu estou generalizando aqui, não quero ser injusto, porque assim, a gente tem muito pecuarista no Brasil com um nível de profissionalização espetacular, até referência para o mundo, mas quando eu olho de forma geral, que foi a pergunta que você me fez, a agricultura está na frente. A agricultura está na frente porque ela já tem um planejamento de safra, de antecipação, o produtor da agricultura já é mais acostumado a ter um planejamento, ele já roda mecanismos financeiros mais sofisticados para suportar esse planejamento dele, e é um mercado que está mais consolidado, os grandes grupos, você não tem um mercado tão fragmentado quanto a pecuária. A pecuária a gente também tem que fazer uma distinção, o mercado avícola no Brasil já é um mercado bastante consolidado, em consequência, é mais profissionalizado, então você, hoje, a avicultura está concentrada em grandes grupos, se você pegar 50% da produção avícola no Brasil, ela está na mão de três grandes grupos, se você olhar o restante, você vai fatiar aí 50 outros grupos que vão deter, junto com esses três, os outros 50 vão ser responsáveis por 90% da produção agrícola no Brasil, 85, 90%. Então é um mercado mais consolidado, e com isso, a adoção de tecnologia e a profissionalização vai mais rápido. Isso você vai para suínos, eu diria que está um passo atrás da avicultura, você tem uma massa mais fragmentada de produtores, mas ao mesmo tempo você já tem grandes grupos, você já tem uma profissionalização maior, quando você vai para a pecuária, tanto de leite quanto de corte, você tem sim grandes grupos que estão se consolidando, estão crescendo, estão investindo, mas você passa a ter uma massa de produtores gigantesca no Brasil, a pecuária de corte de leite, essa é uma curiosidade interessante que eu aprendi aqui depois que eu entrei no agronegócio, você tem produção de pecuária de leite ou de corte em todo município brasileiro, é o único business, vamos dizer, que existe em qualquer município brasileiro, então qualquer município que você for você vai ter algum produtor de leite ou de corte lá, algum pecuarista produzindo leite ou carne bovina. E por ser mais fragmentado, esse é um setor que ainda, na minha visão, está alguns steps atrás em termos de tecnologia, de adoção, de maturidade, dos outros que eu comentei. Então é um setor que se consolida ainda, que tem muitos produtores pequenos, que acabam saindo do negócio, ou aqueles pequenos sobrevivem ou seguem no negócio dentro deu um contexto de cooperativa, que é um modelo, como eu falei, muito interessante, mas sem dúvida a agricultura está em um nível mais avançado, na minha visão, do que a pecuária.
Cassio Politi: Bacana, e para a gente fechar aqui, Leo, queria falar um pouco de sustentabilidade com você, porque a gente sempre ouve dizer que o desperdício de insumos é um problema gigantesco no Brasil, aliás desperdício de tudo, a gente vai do insumo, é um alimento inclusive, em toneladas e toneladas de alimentos sendo desperdiçados por ano, talvez por dia, no Brasil. E eu sempre ouço dizer isso, o desperdício de insumo é um problema, ainda mais hoje que não tem tanta terra nem recurso disponível como tinha antigamente. Como é que a tecnologia pode ajudar nesse sentido?
Leonardo Gondim: Assim, a sustentabilidade, Cassio, é o grande tema hoje para mim do agronegócio, e vai ser o grande tema nos próximos anos, a gente daria para fazer um podcast só sobre sustentabilidade do agronegócio, ou vários deles. Sobre o desperdício especificamente, aí no mundo, não é só no Brasil, mas você tem… o grande desperdício de valor agregado está no alimento, porque você tem hoje estimativas aí, as estimativas variam, mas você pode considerar que ao redor de 30% do que é produzido dentro da terra até chegar ao consumo em si, então aí no transporte, no armazenamento, na gôndola do mercado, na geladeira de casa, você tem desperdício. Eu estava conversando com um cafeicultor outro dia, ele falou assim: “Leo, você sabe qual é o maior consumidor de café do mundo?”, eu falei assim: “Será que é o brasileiro? É o americano?”, ele falou: “Não, é o ralo da pia, porque você faz o café, e aquilo que sobra acaba indo para o ralo da pia, onde vai a maior parte do café do mundo”, falei: “Interessante, não tinha pensado por esse aspecto”. Mas existem desperdícios em várias etapas da cadeia, a tem muita startup inclusive atacando isso, esse não é um problema simples de resolver, mas com certeza tem muita oportunidade, daria para alimentar muito mais pessoas do mundo simplesmente resolvendo o problema do desperdício. O desperdício de… aí falando de tecnologia e startup, você tem startups hoje que estão focadas em agilizar a venda de produtos próximo ao vencimento, por exemplo, você tem startups que estão desenvolvendo embalagens que protegem mais o alimento e permitem que ele tenha uma longevidade, ou tenha mais segurança no transporte para ter menos desperdício. Aí também você tem startups tentando produzir hortas hoje em ambientes urbanos, as famosas fazendas verticais, tudo isso para reduzir desperdício, diminuir a distância entre produção e consumo, e o tempo entre produção e consumo. Do lado de insumos, a grande mudança, a grande mudança de paradigma que a gente vai ver olhando para os próximos anos é a agricultura de precisão. Então hoje você faz… grande história da agricultura, você faz a medida do que você vai fazer de fertilizante, de implemento por metro quadrado, você sempre fez a conta por espaço territorial, vamos chamar assim, e você vai, agora, para uma agricultura de precisão, onde equipamentos vão colocar a gota, vão repositar o fertilizando, o herbicida, na planta, direto no ponto onde precisa, ou você vai fazer uma adubação de solo só naquele solo que é pobre, porque você vai ter medição do componente nutricional do solo com muito mais precisão do que você tem hoje. Então, o caminho é para a gente ter a famosa agricultura de precisão, a pecuária de precisão, que vi reduzir muito o desperdício do que você gasta para produzir. Do lado da produção animal, Cassio, acho que é um exemplo importante também, a gente trabalha muito em coisas que melhorem, por exemplo, a conversão alimentar. Ou seja, você entrega menos comida para o animal e transforma aquilo em carne de forma mais eficiente. E aí práticas de manejo, práticas de sanidade, aditivos nutricionais, enzimas, tecnologias associadas a nutrição vão… hoje já fazem isso, mas vão cada vez mais melhorar essa conversão, para você conseguir produzir mais carne com menos insumo. Então, aí tem um sem-número de tecnologias também que já atuam e vão continuar aumentando a eficiência, justamente para atacar o desperdício que você comentou.
Cassio Politi: Leo, quero te agradecer muito por essa conversa, você domina tão bem o assunto, fala com muita facilidade, com muita clareza para quem é leigo, então isso é legal, o bom professor é esse, que traduz o conhecimento e a informação é fácil para qualquer pessoa, como é o meu caso, como é o caso de muita gente que é mais ligada em tecnologia, mas impossível para qualquer ser vivo ignorar o agro, ainda mais no Brasil, ainda mais diante da importância que o agro tem aqui no Brasil, do peso que ele tem no nosso PIB. Por isso te agradeço muito, Leo, pelo papo de hoje, obrigado e volte mais vezes, viu Leo.
Leonardo Gondim: Eu que agradeço, Cassio, e eu também gosto de falar que o agro não está só na comida, a gente falou aqui muito de alimento e tudo mais, mas a roupa que a gente veste, a cadeira que a gente sente, o carro que a gente dirige, o agro está em tudo, a propaganda não é enganosa, agro é pop, agro é tech, agro é tudo, e realmente está em tudo que a gente… então é uma indústria primordial para o ser humano. E de novo, obrigado pelo convite, é uma honra, é um prazer bater esse papo contigo, estou sempre à disposição.
Cassio Politi: Muito bem, vamos chegando ao final do Think Tech de hoje, e eu deixei alguns links na descrição do podcast, como o estudo que o Leo Gondim da Cargill mencionou, do IMD da Suíça, e essa parte final agora da conversa com o Leo me incomodou um pouco, me fez pensar no quanto de desperdício de alimento tem aí no mundo, e mais especificamente no Brasil. Eu sei que você só se alimenta de dados, não é Sara? Mas desperdício de alimento também preocupa você?
Sara: Me preocupa muito, Cassio, todos os anos, o Brasil desperdiça 27 milhões de toneladas de alimentos, 60% desse desperdício vem das famílias, com tanta gente passando necessidade no país, se houvesse alguma tecnologia capaz de amenizar esse desperdício seria ótimo.
Cassio Politi: Ô se seria, quem sabe alguém não traz essa inovação em breve. É isso aí, o Think Tech de hoje fica por aqui, até a próxima.